sábado, 28 de janeiro de 2012

Cobertura do evento "Erico Verissimo e Incidente em Antares"

No último dia 26, quinta-feira, foi realizado no Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro um bate-papo com participação dos jornalistas Luis Fernando Verissimo e Sérgio Rodrigues intitulado "Erico Verissimo e Incidente em Antares". Além de abordar o livro propriamente dito, o evento se mostrou uma ótima oportunidade para o público conhecer melhor a obra do autor gaúcho, que teve trechos de sua vida relembrados por seu filho, Luis Fernando.


O Instituto recebeu grande público e lotou a sala de cursos. Alguns outros jornalistas também estavam presentes, como Arthur Dapieve e Zuenir Ventura, além de uma equipe do canal GloboNews, que fazia gravações no local.


A escolha do local e o nome da palestra não foram por acaso. Desde 2009, o Instituto Moreira Salles abriga o acervo literário de Erico Verissimo. Uma biblioteca foi formada para tal, contendo cerca de 1900 itens, entre livros, periódicos e manuscritos. Aos interessados, é possível ter acesso ao acervo.

O evento também foi uma forma encontrada pelo Instituto de homenagear os 40 anos do último livro do escritor, "Incidente em Antares", lançado em 1971. Planejado para o fim do ano passado, o evento acabou  não acontecendo na data prevista devido à incompatibilidade de agendas e datas entre os dois principais palestrantes.
O jornalista Sérgio Rodrigues

O bate-papo começou com Sérgio Rodrigues falando. Esse afirmou que foram os livros de Erico Verissimo que o fizeram optar em seguir a carreira de jornalista e escritor. Rodrigues mostrou grande interesse também pelos prefácios escritos pelo próprio Erico em suas obras, quando essas ainda eram lançadas pela editora Globo.

Na época do lançamento do livro, o Brasil vivia sob o regime militar da ditadura, que, por vezes, chegou a censurar inúmeras publicações. No entanto, a prática de censura aos livros propriamente ditos não era tão comum. Quando essa hipótese de censura aos livros foi cogitada pelo então ministro Alfredo Buzait, a classe de escritores se manifestou rapidamente. Além de Erico Verissimo, autores como Jorge Amado vieram a público criticar a medida, que acabou perdendo forças e não sendo aprovada. Aproveitando-se da polêmica,  o livro foi lançado pela editora Globo de Porto Alegre com um sugestivo slogan : "Em um país totalitário, esse livro seria proibido."

O livro "Incidente em Antares" se passa em uma cidade fictícia chamada Antares, no Rio Grande do Sul, no ano de 1963, ou seja, às vésperas do regime militar. Mas poderia ser em qualquer cidade, na verdade, como bem ressalta Luis Fernando: "no fundo, Antares é um microcosmo do mundo inteiro". Fazendo um breve resumo para quem não conhece a história (e aqui já fica a recomendação para conhecer essa obra) e sem contar o final: sete pessoas morrem em Antares. Contudo, na época havia uma greve de coveiros na cidade, o que impedia que os corpos fossem devidamente enterrados. Sem saber o que fazer então, esses sete mortos resolvem ir ao coreto da praça principal para aguardar o desfecho da greve, chamando a atenção de todos os moradores da cidade. Mas o que mais impressiona, como bem destacou Sérgio Rodrigues, "é que os mortos falam coisas que muitos vivos não diriam".

O livro é dividido ainda em duas partes. A primeira se propõe a apresentar a cidade de Antares, bem como o contexto em que estava inserida: em meio às oligarquias do Rio Grande do Sul. A segunda, bem menor que a primeira, já trata do incidente em si.

Há ainda alguma semelhanças entre "Incidente em Antares" e a trilogia o "O Tempo e o Vento". Para Sérgio Rodrigues, "Antares seria uma espécie de Santa Fé (principal cidade da trilogia) mais caricatural", "é a retomada d'O Tempo e o Vento em forma de farsa". Além disso, um dos personagens citados em "Incidente", Martin Francisco, era da família Terra-Cambará, família que tem sua vida retratada na trilogia.

A inspiração para essa última obra veio a partir de uma própria greve de coveiros ocorrida no Estados Unidos, na época em que Erico morava lá, lecionando a disciplina de Literatura Brasileira na Universidade da Califórnia.

Os Estado Unidos, por sinal, geravam fascínio em Erico. Para ele, lá estava a verdadeira representação de democracia na época e a liberdade de expressão. Não à toa, chegou a morar no país duas vezes, uma convidado pelo próprio Departamento de Estado Americano. Anos depois, no entanto, ele viria a se desiludir com o país e sua política externa. Tal insatisfação pode ser observada em um de seus romances, "Senhor Embaixador", publicado em 1965.

Erico Verissimo e sua máquina de escrever

A obra de Erico Verissimo costuma ser dividida em 3 partes. A primeira fase seria a dos romances urbanos, como "Clarissa" e iria até o livro "O resto é silêncio" (1943). A segunda parte seria composta pela trilogia "O Tempo e o Vento", dividida nas obras "O continente",  "O retrato" e "O arquipélago". Curiosamente, tanto Erico quanto seu filho Luis Fernando têm como seu romance preferido "O continente". Luis Fernando se recorda ainda dos tempos de criança quando ficava ao lado da máquina de escrever do pai, esperando ansiosamente as folhas saírem para devorar mais uma leitura. Por fim, a terceira fase da obra de Erico é a dos romances políticos, na qual estão incluídos "O senhor embaixador" e "O prisioneiro". "Incidente" apesar de estar contextualizada nessa terceira fase, era considerada por Erico um "romance estuário", isto é, toda sua obra e  o que havia feito acabava por desaguar ali, retomando as demais fases inclusive.

Para Luis Fernando e Sérgio Rodrigues, contudo, havia muito preconceito da crítica com Erico. Parte da imprensa chamava-o "escritor menor". Para seu filho, isso pode estar em parte relacionado ao fato de seu pai não ser do eixo Rio-São Paulo. Para exemplificar a questão, Luis Fernando lembra das inúmeras técnicas narrativas inovadoras que seu pai utilizava em suas obras. Uma delas era bem semelhante às técnicas utilizadas no cinema, o que foi amplamente criticado na época. Todavia, tempos depois, esse tipo de montagem passou a ser elogiado.

Luis Fernando Verissimo
Uma  pergunta inevitável também foi feita para Luis Fernando durante o bate-papo: se ele sentia uma pressão maior, como uma sombra, por ter sido filho de escritor e ter acabado seguindo os trilhos do pai. O filho respondeu que não, pelo contrário. Ele só começou a escrever mais velho, depois dos 30 anos. Acredita até que, inconscientemente, o fato do pai ser escritor até acabou o inibindo-o. Apesar de Erico aprovar os textos do filho, os dois não chegavam a trocar conselhos, nem discutir sobre literatura em casa.

Coincidência ou não, sorte de nós brasileiros que podemos usufruir da obra desses dois grandes escritores, pai e filho.

3 comentários:

  1. Muito bom, aumentou minha curiosidade sobre o livro, que, por coincidência, ganhei de natal...srrsrs Excelente..

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  2. Adorei o post,Maria Clara! Pena não ter visto a palestra. E me interessei pelo livro! Parabéns pela cobertura!

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  3. Obrigada, Daniel e Julia. Acho q vcs vão gostar do livro. Tentei não falar muito da história dele em si, para não estragar a leitura.

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