quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Setembro

Na sala de casa, um porta-retrato guarda uma doce lembrança. Em preto-e-branco, a foto já demonstra sinais de envelhecimento. A imagem vai aos poucos se apagando e o papel fica amarelado.



Quem adentra aquela residência, se depara de imediato com a foto do casamento dos donos da casa. A imagem denuncia a alegria daqueles dois, então recém-casados. Mas o tempo também se mostra implacável. O marido já não tem mais aquele penteado certinho, ajeitado com gel para a ocasião. Na verdade, hoje os fios sãos parcos e raros. A esposa, por sua vez, já não tem a mesma elegância de outrora. Acabou engordando um pouco com o passar dos anos.

Todavia, já não temos mais tempo para ficar admirando a foto e se prendendo ao passado. Está na hora de nosso casal dar sua tradicional caminhada.

A chegada até a rua e, posteriormente, até a praça, é complicada. Os dois já não têm a mobilidade de outros tempos. Precisam andar devagar, passo-a-passo. O marido precisa também do auxílio da bengala. Mas nada disso tira a motivação do casal para mais um dia juntos.

Ao chegar à praça, exaustos, procuram um lugar para descansar. Uma moça cede, gentilmente, seu lugar no banco. O casal reluta à primeira oferta, mas acaba cedendo. Sorriem para a jovem como forma de agradecimento.

Sentados e mais aliviados, procuram agora esticar as pernas. Sentem então as primeiras dores da caminhada: nos joelhos, nos pés, nos quadris... Aos poucos, contudo, tentam esquecer a dor e começam a prestar atenção ao redor: o sol batendo, as crianças brincando nos balanços e o vendedor de algodão-doce. Junto a isso tudo, surgem também algumas lembranças. Como a do dia em que se conheceram, das viagens com os amigos, da surpresa da gravidez da esposa, da alegria do primeiro neto...

De repente, algo inusitado acontece: os dois acabam se dando as mãos, sem combinar nada com o outro. Algo espontâneo.



E assim permanecem as mãos, entrelaçadas, por toda aquela manhã ensolarada de setembro.

7 comentários:

  1. Uma história de amor, tão verdadeira é sempre cativante. O amor deve ser algo que atravessa barreiras de espaço e tempo! Parabéns pelo texto. Bjos

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  2. Gel? Devia ser brilhantina!! ahahaha

    Texto lindo, flor.
    Lembrei dos meus avós maternos. Graças a Deus eles não têm essas dores, mas fazem de um tudo para estarem sempre juntos rs

    Acho q me inspirei rs

    Beijos

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  3. Para o verdadeiro amor, não é preciso eventos mirabolantes, mas apenas o toque sutil e sincero, para que todo dia se torne um momento digno de ser lembrado. Ainda que as fotos se desgastem, nunca o sentimento desses momentos é capaz de passar, é imóvel, diferente do tempo, não corre, diferente do espaço, não se desloca, não fica longe. Esses momentos existem em algo além, além do tangível, que apenas o coração pode sentir, e se renovar ao fazê-lo. Excelente post!

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  4. Um texto simples e lindo pra explicar um sentimento com as mesmas características. Adorei, Maria, ficou ótimo.

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